17/03/22 | São Paulo
Comparação é com o ano de 2020, de acordo com a Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (ABSOLAR). Economia chega a 95% na conta de energia elétrica de residências. Marco Legal da Energia vai deixar economia menor a partir de 6 de janeiro de 2023, então tendência é de crescimento ainda maior em 2022.
A demanda por instalação de painéis de energia solar em casas e estabelecimentos comerciais triplicou na capital paulista em 2021 em comparação a 2020, de acordo com a Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (ABSOLAR).
A economia na conta de energia elétrica – que ficou ainda mais cara no ano passado – é apontada por especialistas como o principal motivo para a alta. Com as placas instaladas nos telhados, é possível economizar até 95% na conta de luz de casas e de 60% a 70% em empresas de média tensão.
O painel fotovoltaico, como é chamado, capta a luz solar e a transforma em energia elétrica para a utilização na casa ou comércio. Se o consumidor passa o dia fora de casa, por exemplo, e não consome a energia gerada, ela é fornecida para a concessionária de energia local para abastecer outros consumidores e gera um “crédito” para quem forneceu com até cinco anos para utilizar.
Além disso, a energia solar é considerada melhor para o meio ambiente, porque utiliza a luz do sol para gerar energia e deixa de usar outras fontes, como a queima de combustíveis fósseis – responsável por emitir gases que aumentam o aquecimento global.
O investimento neste tipo de energia, porém, ainda é alto. Ele leva em média cinco anos para se pagar e dar retorno financeiro, de acordo com a ABSOLAR.
Em todo o Brasil e no estado de São Paulo, o segundo do país no ranking de energia solar, os números dobraram em 2021 em relação a 2020. Já na capital, triplicaram.
O número de novas conexões de energia solar passou de 756 em 2020 para 2.113 em 2021 na cidade de São Paulo. Foram 793 novos consumidores em 2020 e 2.198 no ano passado. Em termos de megawatts de potência instalada no ano, foram 6,9 megawatts em 2020 e 16,2 megawatts em 2021. Veja no gráfico abaixo:
Para Roberto Zilles, diretor do Instituto de Energia e Ambiente (IEE) na Universidade de São Paulo (USP) e coordenador de pesquisa em energia fotovoltaica na universidade, a alta da demanda se explica por três fatores:
“O crescimento tem muito a ver com o benefício econômico, que é muito interessante. Não quero tirar a importância dos benefícios sociais, de geração de emprego, e dos benefícios ambientais. Mas hoje colocar o sistema na sua casa ou no seu comércio é um investimento de 3 a 4 vezes melhor do que se você deixar o dinheiro na poupança. A energia solar é cara se comparada a outros custos, mas nenhuma aplicação no mercado financeiro te dá esse retorno”, afirma Zilles.
“O crescimento tem muito a ver com o benefício econômico, que é muito interessante. Não quero tirar a importância dos benefícios sociais, de geração de emprego, e dos benefícios ambientais. Mas hoje colocar o sistema na sua casa ou no seu comércio é um investimento de 3 a 4 vezes melhor do que se você deixar o dinheiro na poupança. A energia solar é cara se comparada a outros custos, mas nenhuma aplicação no mercado financeiro te dá esse retorno”, afirma Zilles.
A expectativa da associação do setor é a de que o uso de energia fotovoltaica cresça ainda mais nos próximos anos, considerando o cenário de crise hídrica que está previsto para 2022.
Boom
Atualmente o volume de energia solar por geração fotovoltaica no Brasil é de 14 GW, sendo 9,26 GW por geração distribuída por unidades menores e 4,74GW por geração centralizada de grandes usinas, de acordo com a Agência Nacional de Energia Elétrica (Anel).
Esses 14 GW de potência são um pouco mais do que produz a usina hidroelétrica Itaipu. A potência é semelhante, mas a produção não é equivalente porque a energia do sol varia.
Em 2021, quando o Brasil atravessou a maior seca histórica dos últimos 91 anos e o país teve menos água para gerar energia nas hidroelétricas, a matriz elétrica passou a ser as termoelétricas, que possuem custo maior – daí a conta de luz ter ficado cerca de 20% mais cara.
Além do custo mais alto, esse tipo de energia é muito prejudicial ao meio ambiente, de acordo com o professor de mudanças climáticas do Programa de Pós Graduação em Ciência Ambiental (Procam) do Instituto de Energia e Ambiente (IEE) da Universidade de São Paulo, Pedro Côrtes.
“As termoelétricas são movidas, em grande parte, com o uso de combustíveis fósseis como o óleo combustível, gás ou carvão. O uso de combustíveis fósseis como o CO2 incrementa o efeito estufa e aumenta a poluição do ar, razão pela qual deveríamos reduzir o uso de termoelétricas movidas a óleo carvão ou gás. Além disso, a energia gerada pelas termoelétricas é a mais cara do país, só ficando abaixo da energia nuclear, que é um tipo de termoelétrica bem específica. O custo de operação das termoelétricas é muito alto e isso sempre é repassado para o consumidor”, afirma.
“As termoelétricas são movidas, em grande parte, com o uso de combustíveis fósseis como o óleo combustível, gás ou carvão. O uso de combustíveis fósseis como o CO2 incrementa o efeito estufa e aumenta a poluição do ar, razão pela qual deveríamos reduzir o uso de termoelétricas movidas a óleo carvão ou gás. Além disso, a energia gerada pelas termoelétricas é a mais cara do país, só ficando abaixo da energia nuclear, que é um tipo de termoelétrica bem específica. O custo de operação das termoelétricas é muito alto e isso sempre é repassado para o consumidor”, afirma.
De acordo com Côrtes, no Brasil há algumas termoelétricas que utilizam como combustível o bagaço de cana que são neutras em relação à emissão de gases de efeito estufa, pois o CO2 emitido é capturado na ocasião do plantio da próxima safra de cana de açúcar, estabelecendo um circuito fechado em relação a esse gás.
Côrtes é um dos revisores do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, sigla em inglês). O relatório do ano passado afirmou que as mudanças climáticas causadas pelos seres humanos são irrefutáveis, irreversíveis e já levaram a um aumento de 1,07º na temperatura do planeta.
Além, disso, o relatório demonstrou que uma alta de 1,5°C a 2°C será vista neste século se não houver uma profunda redução nas emissões de gases de efeito estufa. Nesse contexto, o aumento do uso de energia solar é muito positivo, de acordo com o professor.
“O uso da energia solar em residências e empresas mostra que a população está buscando alternativas face ao custo elevado da energia elétrica no país e diante das incertezas sobre a capacidade de atendimento da demanda atual. É um movimento muito positivo, pois é uma fonte de energia limpa, sem as externalidades das termoelétricas movidas a combustíveis fósseis.”
As empresas têm se preocupado cada vez mais em adotar práticas sustentáveis, o que também justifica o aumento das instalações de painéis de energia solar em prédios comerciais, especialmente em multinacionais com sedes em São Paulo, de acordo com o sócio-fundador da empresa Fotossíntese Tecnologia Solar, Fábio Meinberg.
Muitas dessas empresas possuem metas de sustentabilidade, chamadas de Environmental, Social and Governance (ESG – sigla em inglês) ou Ambiental, Social e Governança (ASG — em português). O conceito é usado para descrever o quanto um negócio busca meios de minimizar seus impactos ao meio ambiente, se preocupa com as pessoas e adota boas práticas administrativas.
“Apesar de não termos um governo que veja isso como prioridade, há uma pressão global de redução de gases de efeito estufa e uma das formas de garantir isso é usar energia limpa e renovável. Por isso muitas empresas têm investido em painéis para garantir uma fonte limpa. É um tendência que tende a crescer” afirma o empresário.
Meinberg foi um dos empresários do meio que sentiu o boom do setor no ano passado principalmente por causa da alta da conta de luz e apesar dos custos de instalação. Para ele, o perfil do consumidor está mudando.
“Em 2017 ninguém sabia o que era energia solar. Para fazer uma venda a gente tinha de explicar muito até as pessoas entenderem, ainda havia muito receio por se tratar de uma tecnologia ainda não tão difundida. Hoje mais gente conhece, não é tão novo, e todo mundo já conhece um amigo ou vizinho que tem. Apesar de virem pelo bolso, as pessoas refletem e têm essa mudança de consciência sim de energia limpa”, afirma.
“Em 2017 ninguém sabia o que era energia solar. Para fazer uma venda a gente tinha de explicar muito até as pessoas entenderem, ainda havia muito receio por se tratar de uma tecnologia ainda não tão difundida. Hoje mais gente conhece, não é tão novo, e todo mundo já conhece um amigo ou vizinho que tem. Apesar de virem pelo bolso, as pessoas refletem e têm essa mudança de consciência sim de energia limpa”, afirma.
A empresa de Meinberg faz desde a compra dos painéis na China, passando pela instalação e pela homologação com a concessionária de energia elétrica.
O custo de instalação varia de acordo com o preço da conta de luz do consumidor e a economia chega até a 95%. Veja abaixo uma estimativa de custos para a instalação de painéis de energia solar:
O aposentado Abel Fernandes Tavares, 72 anos, morador do bairro Planalto Paulista, na Zona Sul da capital paulista, é um dos consumidores responsáveis pelo crescimento do setor em 2021. Ele possui 12 placas fotovoltaicas em casa.
As primeiras foram compradas em 2015, mas elas só começaram a funcionar em 2018, quando ele conseguiu a homologação junto à Enel. No ano passado, ele quis expandir ainda mais a produção de energia em casa. Tavares conta que foi atraído pela economia na conta de luz, mas também acredita no benefício para o planeta.
“Como minhas placas são mais antigas, a diferença na conta de luz varia entre 30 a 50% dependendo da época. Gera mais energia no verão. Eu já tinha conhecimento da tecnologia por ver fora do Brasil, sempre li sobre coisas novas e achava uma coisa absurda de boa. E é!”
Tavares enumera os benefícios, que vão além das cifras economizadas.
“Uma vez instalada, você não tem dor de cabeça e mão de obra nenhuma. Para fazer a instalação não precisa quebrar nada na casa, ao contrário do sistema de aquecimento de água, que também são placas, mas tem de ter toda a estrutura de tubulação específica. A energia solar é prática e não faz barulho, não dá dor de cabeça”, afirma.
“Uma vez instalada, você não tem dor de cabeça e mão de obra nenhuma. Para fazer a instalação não precisa quebrar nada na casa, ao contrário do sistema de aquecimento de água, que também são placas, mas tem de ter toda a estrutura de tubulação específica. A energia solar é prática e não faz barulho, não dá dor de cabeça”, afirma.
A desvantagem ainda é o preço alto, de acordo com ele.
“Ainda é muito caro e feito na conta do dólar. O preço é muito mais alto do que a realidade. Seria ótimo se fosse mais barato. Mas tudo o que eu puder fazer pelo planeta, vou fazer. Acabei de comprar uma composteira, uma espécie de recicladora de alimentos que transforma em adubo”, conta.
“Ainda é muito caro e feito na conta do dólar. O preço é muito mais alto do que a realidade. Seria ótimo se fosse mais barato. Mas tudo o que eu puder fazer pelo planeta, vou fazer. Acabei de comprar uma composteira, uma espécie de recicladora de alimentos que transforma em adubo”, conta.
O diretor-executivo da empresa cuiabana Enerzee, Alexandre Serafico, 48 anos, também vê uma mudança de perfil dos consumidores em São Paulo. Ele conta que a economia ainda é o principal atrativo para conquistar novos clientes e ela vai além da conta de energia elétrica.
“Você pode usar a energia elétrica gerada pelos painéis para economizar na conta de gás e usar fogão por indução e forno elétrico, por exemplo, instalar aquecimento elétrico… O próximo passo são os carros elétricos. A um custo que depois que se paga”, projeta.
“Você pode usar a energia elétrica gerada pelos painéis para economizar na conta de gás e usar fogão por indução e forno elétrico, por exemplo, instalar aquecimento elétrico… O próximo passo são os carros elétricos. A um custo que depois que se paga”, projeta.
“Percebo que mudou bastante o perfil do consumidor. São Paulo era um lugar onde tínhamos mais dificuldade de convencer o cliente que era viável e que fazia sentido, mas agora as pessoas estão mudando. A parte econômica é levada em consideração, mas as pessoas também têm a sensação de estar fazendo bem para o meio ambiente usando uma energia limpa e melhorando a qualidade de vida. As pessoas querem mais sustentabilidade e além disso, a cada dia que passa temos mais um gadget para ligar na tomada. É muita tecnologia que consome energia elétrica”, afirma.
“Percebo que mudou bastante o perfil do consumidor. São Paulo era um lugar onde tínhamos mais dificuldade de convencer o cliente que era viável e que fazia sentido, mas agora as pessoas estão mudando. A parte econômica é levada em consideração, mas as pessoas também têm a sensação de estar fazendo bem para o meio ambiente usando uma energia limpa e melhorando a qualidade de vida. As pessoas querem mais sustentabilidade e além disso, a cada dia que passa temos mais um gadget para ligar na tomada. É muita tecnologia que consome energia elétrica”, afirma.
O comerciante Silvio Noda mora e tem uma loja de roupas infantis no bairro da Casa Verde, Zona Norte da capital paulista. Ele teve o sistema instalado em agosto e homologado em outubro do ano passado e se diz bastante satisfeito.
“O sistema foi projetado para gerar mais ou menos 800KW/mês. Essa potência seria a potência gasta aqui na minha loja mais a minha casa. Esse mês pela primeira vez consegui reduzir a conta em casa e aqui na loja em aproximadamente 80% do valor total que pagava antes do sistema. Por enquanto estou muito satisfeito”, afirma.
“O sistema foi projetado para gerar mais ou menos 800KW/mês. Essa potência seria a potência gasta aqui na minha loja mais a minha casa. Esse mês pela primeira vez consegui reduzir a conta em casa e aqui na loja em aproximadamente 80% do valor total que pagava antes do sistema. Por enquanto estou muito satisfeito”, afirma.
Marco regulatório
O professor Zilles participou do processo regulatório da energia solar no Brasil desde os anos 90, que culminou com a sanção da Lei 14.300/22, conhecida como Marco Legal da Energia, no último dia 7 de janeiro.
De acordo com o Marco Legal, a partir de 2023 passará a ser cobrado um “pedágio” de 15% do montante de energia produzida pelas placas, tarifa que não é cobrada atualmente. A porcentagem vai aumentando gradativamente até chegar a 90% em 2029. A economia na conta de energia vai ficar menor, mas os painéis de energia solar fotovoltaicos instalados e homologados até 6 de janeiro de 2022 se manterão na regra antiga, mais vantajosa.
Essa corrida é o que por fim explica a demanda ter triplicado na capital paulista e dobrado no Brasil e no estado de São Paulo, de acordo com Zilles. E a tendência é que a demanda cresça ainda mais este ano.
“As pessoas estão fazendo tudo pelo benefício econômico, quem faz pelo meio ambiente é uma minoria. Dobrou a demanda no país por causa da corrida de pessoas que querem o quanto antes instalar para participar de uma regra mais favorável. É bem possível que em 2022 teremos um crescimento ainda maior, dependendo da capacidade da cadeia de instalar. O problema é mais logístico”, afirma.
“As pessoas estão fazendo tudo pelo benefício econômico, quem faz pelo meio ambiente é uma minoria. Dobrou a demanda no país por causa da corrida de pessoas que querem o quanto antes instalar para participar de uma regra mais favorável. É bem possível que em 2022 teremos um crescimento ainda maior, dependendo da capacidade da cadeia de instalar. O problema é mais logístico”, afirma.
Para Zilles, no entanto, apesar da perda do subsídio, o marco legal também tem vantagens, como a segurança jurídica e o investimento em novas tecnologias.
“O sistema de compensação sem a cobrança do pedágio é um incentivo, é um subsídio. Os ajustes que estão sendo feitos são para permitir a entrada de outras tecnologias. Aquilo que produzo e não estou consumindo, a concessionária vai retirar 15% a partir de 2023. Mas haverá outras tecnologias dentro da unidade consumidora.”
“Se está o maior sol e não estou em casa, por exemplo, essa energia que está sendo gerada e não está sendo consumida a empresa me deixa com crédito, mas em 2023 ela não vai me devolver inteira, vai ter esse pedágio de 15% para remunerar quem mantém a estrutura funcionando. Aí que entram as novas tecnologias. Posso não vou entregar a energia gerada para a empresa, vou armazenar no meu sistema para usar à noite, quando a energia é mais cara. Será possível fazer a gestão ativa da demanda em uma rede mais inteligente”, explica Zilles.