04/09/24 | São Paulo
Canal Solar conversou com Ricardo Ferreira da Costa, Gerente Sênior de Impostos Indiretos da Ernst & Young.
Reportagem publicada pelo Canal Solar
Promulgada* em 20 de dezembro de 2023 e atualmente em fase de regulamentação no Congresso, a Reforma Tributária ainda gera muitas incertezas quanto aos impactos no setor elétrico, especialmente no segmento fotovoltaico.
Para esclarecer os possíveis efeitos dessa mudança na tributação, o Canal Solar conversou com Ricardo Ferreira da Costa, Gerente Sênior de Impostos Indiretos da Ernst & Young.
Ele foi um dos palestrantes na primeira Masterclass organizada pela ABSOLAR, realizada em 21 de agosto, na sede da FIESP (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).
A Reforma Tributária, discutida há décadas, tem como objetivo simplificar a cobrança de impostos no Brasil. O novo sistema de tributação será composto pelos seguintes tributos:
O período de transição da Reforma Tributária começará em 2026 e será concluído em 2033. Não haverá alterações na cobrança dos impostos em 2024 e 2025. A partir de 2026, o Brasil entrará em um regime de transição com dois sistemas tributários. Em 2027, o PIS/Cofins será extinto, e entre 2029 e 2033, será o fim da cobrança do ICMS e ISS.
Confira a seguir os principais trechos da entrevista Ricardo Ferreira.
Quais os impactos da reforma na Geração Centralizada?
O setor de Geração Centralizada (GC) está acostumado com diversos benefícios fiscais, como desonerações nas fases de capex e montagem, e uma tributação de apenas 3,65% de PIS/Cofins na fase operacional.
Com a nova estrutura tributária, os desenvolvedores continuarão a usufruir de benefícios na fase pré-operacional, possivelmente até maiores do ponto de vista tributário. No entanto, na fase operacional, a alíquota migrará de 3,65% (PIS/Cofins) para uma nova incidência pelo IBS e CBS. Embora a alíquota ainda não esteja definida, a referência atual é de 26,5%, mas isso ainda depende de discussões no Senado.
Isso significa que haverá aumento de carga tributária para GC?
É importante distinguir dois aspectos: a nota fiscal incluirá mais impostos, mas isso não significa necessariamente que a energia comercializada ficará mais cara. O valor da nota pode aumentar, mas o custo efetivo da energia pode não subir. Isso porque, em alguns casos, o tributo não era recuperável. Com a Reforma, o imposto pago na compra de energia, mesmo com uma alíquota maior, pode se tornar recuperável. Isso pode até resultar em um custo menor para o comprador, comparado ao regime anterior de 3,65% sem recuperação.
Quais as repercussões da reforma na Geração Distribuída?
A Geração Distribuída (GD) opera de maneira diferente, com contratos de arrendamento de terra, máquinas e equipamentos, cada um com sua tributação específica. Agora, todos serão tributados de maneira uniforme, com uma alíquota de referência de 26,5%.
Para clientes que operam como pessoa jurídica, o imposto será recuperável. No entanto, para contratos envolvendo pessoas físicas, pode haver um aumento no custo dos contratos de GD.
Além disso, o REIDI (Regime Especial de Incentivos para o Desenvolvimento da Infraestrutura) pode continuar a oferecer desonerações na fase de capex.
Quais seriam os impactos para as empresas de instalação de usinas solares?
Se o benefício do REIDI for estendido para os serviços contratados na fase pré-operacional, é provável que as empresas do setor possam oferecer esses serviços com menos impacto tributário.
Hoje, o ISS representa um custo significativo para os projetos, mas isso pode mudar. Suponha que você cobre 10, sendo que parte desse valor é composta pelo ISS. Com a Reforma, o cliente poderá recuperar esses tributos, fazendo com que o custo efetivo caia, retirando o efeito do tribuno não recuperável pelo contratante.
Isso pode abrir uma nova estratégia comercial para as empresas ao precificar seus serviços, aproveitando a recuperação dos tributos. Tanto para a Geração Distribuída (GD) quanto para a Geração Centralizada (GC), desde que beneficiadas pelo REIDI, a lógica é a mesma.
Assim, o ISS, que atualmente é um custo, será substituído pelo IBS, que é recuperável. O preço final pode até ser maior, mas o custo efetivo para o cliente será menor.
Como fica a questão tributária para empresas que distribuem equipamentos fotovoltaicos?
Esse é um desafio significativo para os distribuidores, especialmente aqueles que operam no lucro presumido, pois a carga tributária pode aumentar de 3,65% de PIS/Cofins para uma alíquota de aproximadamente 9% de CBS.
O desafio será encontrar formas de viabilizar as vendas para diferentes tipos de clientes, especialmente pessoas físicas, sem repassar o aumento de preço. Para clientes pessoa jurídica, o impacto pode ser menor, pois o comprador poderá recuperar o crédito tributário, otimizando o custo, mesmo com um preço nominal mais alto.
Qual será o impacto da reforma tributária para os projetos de GD residenciais, comerciais e industriais (microgeração)?
Antes de tudo, é importante mencionar que a reforma tributária, ao suprimir do sistema tributário o ICMS e o PIS/COFINS, acabará por extinguir, também, importantes regulamentações do setor, tais quais: o Convênio ICMS 16/15 e a Lei nº 13.169/15 (que delimitam a não cobrança do ICMS e do PIS/COFINS nas operações de compensação de energia), bem como o Convênio ICMS 101/97 que garante a isenção do ICMS. Assim, a legislação atual deixará de ser aplicável e os parâmetros serão alterados.
Não há, no dispositivo aprovado no âmbito da Reforma Tributária, qualquer confirmação de que o mecanismo de compensação de energia permanecerá com os benefícios atuais, entretanto poderá se defender que a essência do novo sistema seria incompatível com a cobrança do IBS e da CBS, por inexistir onerosidade (empréstimo gratuito) o que poderia assegurar a não ocorrência do fato gerador.
Caso esse argumento prospere, poderá ser solucionada a discussão acerca de qual o limite que seria incentivado (muitos estados restringiram à 1MW de acordo com o antigo limite de geração), assim como não restringir apenas ao autoconsumo remoto.
Com relação aos benefícios fiscais da fase pré-operacional o benefício do REIDI – recentemente estendido aos projetos de GD, aplica-se somente aos projetos de minigeração distribuída. Portanto, a microgeração não seria incentivada até o momento. Logo, é possível que projetos com essa configuração acabem por assumir oneração adicional, já que além de não ser elegível ao REIDI, os benefícios do Convênio de ICMS 101/97 não serão mais aplicáveis. Ressaltamos que para os casos em que o detentor da usina seja Pessoa Jurídica, poderá – caso não optante pelo Simples Nacional, descontar crédito dos novos tributos.
*É o instrumento que declara a existência da lei e ordena sua execução. Emendas constitucionais são promulgadas pelas Mesas da Câmara e do Senado, em sessão solene do Congresso.